quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Conflitos

Ao reler Política para um Jovem de Fernando Savater, encontrei um excerto que me forneceu uma perspectiva interessante sobre os conflitos que gostaria de partilhar:
“Parece-me a mim que o conflito, o choque de interesses entre os indivíduos é qualquer coisa inseparável da vida na companhia dos outros. E quantos mais formos, mais conflitos poderão declarar-se. Sabes porquê? Por uma razão que a princípio pode nos parecer paradoxal: porque somos demasiado sociáveis. Vou tentar explicar-me. A raiz mais profunda da nossa sociabilidade está no facto de desde miúdos nos arrastar a preocupação de imitarmos uns aos outros. Somos sociáveis porque tendemos a imitar os gestos que vamos fazer, as palavras que ouvimos pronunciar, os desejos que os demais têm, os valores que eles proclamam. Sem imitação natural, espontânea, nunca poderíamos educar uma criança nem por conseguinte condicioná-la de modo a viver em grupo com a sua comunidade. Em primeiro lugar, imitamos porque somos muito parecidos, tão parecidos… que entramos em conflito. Desejamos obter o que vemos que os outros também querem; queremos todos a mesma coisa, mas por vezes aquilo que desejamos só pode ser possuído por alguns poucos ou até só por um. Só um pode ser o chefe, ou ser o mais rico, ou o melhor guerreiro, ou triunfar numa competição desportiva, ou possuir como esposa a mais bela de todas as mulheres, etc. Se não víssemos outros ambicionando tais conquistas, é quase certo que também nós não sentíamos vontade delas, pelo menos tão desesperadamente. Mas como costumam ser vivamente desejadas pelos que nos rodeiam, desejamo-las, por imitação, para nós, não menos vivamente. É assim que a mesma coisa nos aparenta e opõe: o interesse (etimologicamente) é o que está entre duas ou mais pessoas, quer dizer, o que as une, mas também as separa…”